#6- outro monólogo do cinema, o amante de lady chatterley, copo vazio e outras loucuras do amor
na última semana, relembrei um monólogo do filme Me Chame Pelo Seu Nome (consulte aqui), e gostei dessa ideia de destacar monólogos do cinema. lembrei então, de Café com Canela (cinema nacional de altíssima qualidade) assistido recentemente.
CAFÉ COM CANELA EM UM MONÓLOGO INESQUECÍVEL
“Bom mesmo é cinema. É mágico. Quando a gente entra naquela salona, sente logo um cheiro diferente, mais ou menos familiar, mais ou menos aconchegante, perturbador. Dá um friozinho na barriga e dá um pouco de insegurança também... porque mesmo você sabendo que está numa sala cheia de gente, você se sente completamente sozinha diante da tela. É como se cortasse a ligação que você tem com a segurança das coisas e lhe jogasse pra mergulhar de cabeça numa experiência que você nem sabe onde vai dar. Todo mundo diz que cinema serve pra você esquecer da vida, dos problemas e viver num mundo mágico longe da sua realidade. Eu não acredito muito nisso não. Cinema pra mim é aquele que mostra os podres, as limitações, as angústias que todo mundo tem. Um bom filme, antes de tudo, ele quer te experimentar e quer ser experimentado. E quando isso acontece, você perde o chão, perde a vergonha, perde a linha e transcende. No escuro, diante daquela imagem dominada pelo som, que você consegue ficar finalmente diante de si e escutar tudo aquilo que você nunca teve coragem de falar para si mesma, e é nessa hora que você se encontra, se encontra e se perde de uma vez por todas... sem máscara, sem fantasia, mesmo que seja só por alguns minutos. Quando o filme acaba, as luzes acendem, tudo fica diferente... vazio. Aquele que sentou na poltrona, nunca mais vai levantar e aquele que levanta, é novo, é outro. É isso, cinema pra mim é isso.” (CAFÉ COM CANELA)
O AMANTE DE LADY CHATTERLEY NA LITERATURA E NO CINEMA




a leitura de Madame Bovary me remeteu à O Amante de Lady Chatterley (que li ano passado), já que as obras se conversam por diversas razões, principalmente no que tange à liberdade sexual feminina, dando origem a uma geração de personagens em busca das muitas possibilidades que o corpo permite, desafiando todas as insistentes censuras em torno do prazer. as artes de Maria Flexa na edição da antofágica, representam maravilhosamente a atmosfera dessa história arrepiante marcada não somente pelo erótico, mas pela delicadeza, naturalidade e maturidade, além de constantes debates acerca do casamento, luta de classes, desigualdades sociais e econômicas junto aos impactos da industrialização.
as passagens intensas de paixão e sexo entre Constance – casada e muito abastada – com Oliver, o guarda-caças humilde e de temperamento complicado – são cheias de sensibilidade, sensualidade e perfeitamente inspiradas na obra literária publicada em 1928. seja no livro ou no filme, a relação parece sempre permeada por uma tristeza e incerteza de um futuro, carregando também a melancolia/solidão de Constance ao estar ‘presa’ na propriedade rural, vivendo o sufocamento de ser resumida aos cuidados do marido que lhe gera repulsa e tédio. todos esses elementos parecem corroborar para a forte conexão e urgência que exala do casal. não por acaso, a netflix deixa um importante aviso aos que forem assistir o filme (hehe)
COPO VAZIO & COMER, REZAR E AMAR
dia desses, minha amiga (taty do válerumlivro) me pediu emprestado Copo Vazio, de Natalia Timerman. comecei a relatar para ela como me sinto representada pela narrativa da autora que descreve a profunda entrega da protagonista pela paixão nascida de um aplicativo de paquera, e que termina em um abandono repentino, consumindo a protagonista, que busca reviver cada momento guardado em sua memória com o desaparecido, tudo o que foi e o que poderia ter sido. Copo Vazio me pegou profundamente quando o li, e conversar sobre ele me bateu uma saudade gigantesca. adoro a forma como a autora revela com tanta honestidade os relacionamentos contemporâneos, gerando o desconforto pela facilidade em identificar-se com as situações aqui narradas e com a protagonista, que mesmo inteligente e bem-sucedida, também depende da relação amorosa, também se vê completamente sem chão diante o perder-se no outro, diante a falta. por esses e muitos motivos, Copo Vazio é uma experiência íntima, realista e extremamente palpável por aqui. eu me vi em Mirela e eu sou Mirela.
“Na última esquina antes do mercado, Pedro segurou mais firme sua mão para que ela não atravessasse no vermelho para pedestres. Uma moto passava. Depois, sem esperar o verde, seguiram, ele agora com o braço em volta do ombro dela, um tronco colado no outro, os passos ritmados dos dois. (Mirela não tinha como saber que, depois, sempre que descesse aquela rua, sempre que pisasse aquela mesma calçada, buscaria aquele momento, procuraria no chão, no ar, vestígios de Pedro, vestígios de estarem juntos, ou, em si mesma, de quem ela era com ele.)”
enquanto conversávamos sobre o ato de sofrer por amor (quem nunca?), a Taty me mostrou um trecho de Comer, Rezar e Amar que está há dias ininterruptos reverberando por aqui, me veio a necessidade de compartilhar para eternizá-lo de alguma forma:
“Além disso, tenho problemas de limites com os homens. Ou talvez não seja justo dizer isso. Para ter problemas com limites, é preciso primeiro ter limites, certo? Mas eu sou inteiramente tragada pela pessoa que amo. Sou como uma membrana permeável. Se eu amo você, eu lhe dou tudo que tenho. Dou-lhe o meu tempo, a minha dedicação, a minha bunda, o meu dinheiro, a minha família, o meu cachorro, o dinheiro do meu cachorro, o tempo do meu cachorro – tudo. Se eu amo você, carregarei para você toda a sua dor, assumirei por você todas as suas dívidas (em todos os sentidos da palavra), protegerei você da sua própria insegurança, projetarei em você todo tipo de qualidade que você na verdade nunca cultivou em si mesmo e comprarei presentes de Natal para sua família inteira. Eu lhe darei o sol e a chuva e, se não estiverem disponíveis, darei-lhe um vale de sol e um vale de chuva. Darei a você tudo isso e mais, até ficar tão exausta e debilitada que a única maneira que terei de recuperar minha energia será me apaixonar por outra pessoa.” (COMER, REZAR E AMAR)
por hoje é isso, meus queridos e queridas. esgotei a cota de romance pelo resto do ano, mas espero ter valido a pena.
Assisti recentemente café com canela e amei! Que delicadeza. Tbm gosto muito de comer rezar e amar, me curou de muitas dores. 💞
Amei demais, esses dois monólogos são preciosos 💙